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Mídia negra: resistência, representação e estratégias digitais no Brasil

homem negro de camisa polo vermelha dando uma palestra
Um homem negro de camisa polo vermelha, de meia-idade, está em pé na frente de uma grande tela. Ele aponta para o lado direito da tela, onde há uma imagem de uma revista com o título "ALMA JORNALISMO PRETO E LIVRE". O lado esquerdo da tela mostra texto em português em um fundo vermelho. Há reflexos e algumas barras digitais transparentes sobrepostas na tela.

A mídia negra é um dos pilares mais potentes da resistência racial no Brasil. Com mais de 190 anos de história, ela tem funcionado como ferramenta de representação, empoderamento e enfrentamento ao racismo estrutural. Mas, em um mundo cada vez mais mediado por algoritmos e lógicas digitais, quais são os desafios e estratégias dessa mídia para continuar visível, relevante e influente?

A trajetória histórica da mídia negra no Brasil

Uma jovem mulher negra sorridente, com cabelo afro e fones de ouvido, fala em um microfone profissional. O fundo da imagem é composto por uma colagem de páginas de jornais antigos.

A primeira publicação negra do país, “O Homem de Côr”, surgiu em 1833 no Rio de Janeiro e deu início a uma tradição de jornalismo negro marcado por discursos de resistência. Ao longo dos séculos XIX e XX, diversos jornais e periódicos foram criados por e para pessoas negras, denunciando a exclusão, o racismo e a desigualdade.

Esse legado se renova no século XXI com a migração para o ambiente digital. Plataformas como o Mundo Negro, Revista Afirmativa, Agência Alma Preta e Blog Negro Nicolau representam a continuidade dessa história, com protagonismo feminino negro e uma proposta de comunicação insurgente. Segundo o mapeamento do FOPIR (Fórum Permanente pela Igualdade Racial), essas mídias não apenas resistem, mas reinventam a comunicação como ato político.

Um dos pesquisadores que mais tem contribuído para essa discussão é Adriano Batista Rodrigues. Doutorando em Comunicação e Práticas de Consumo pela ESPM, ele investiga como a mídia negra brasileira busca visibilidade em ambientes digitais por meio das mediações algorítímicas. Sua pesquisa articula representação, racialidade, consumo e plataformização, analisando como as mídias negras atuam como agentes políticos diante das desigualdades estruturais e dos desafios tecnológicos impostos pelas plataformas digitais.

O papel político e social da mídia negra

Três mulheres negras estão sentadas em uma mesa de reunião ou gravação. A mulher no centro, de camisa jeans, fala em um microfone. A mulher à sua esquerda, vestindo um blazer estampado e óculos, aponta para a tela de um laptop. A mulher à direita, com um lenço colorido na cabeça, ouve atentamente. O ambiente parece ser um escritório criativo, com pôsteres emoldurados e um quadro branco com anotações ao fundo.

Mais do que informar, a mídia negra é uma ferramenta de formação, representação e resistência. Ela cria espaços para que a população negra construa suas próprias narrativas, combata o epistemicídio e afirme suas subjetividades.

Autores como Sueli Carneiro e Beatriz Nascimento defendem que essa mídia é um “quilombo contemporâneo”, onde se afirmam a existência, a memória e a felicidade negra como formas de subversão da ordem racista hegemônica. A visibilidade aqui não é apenas um efeito de engajamento, mas uma tomada de posição política.

Representação, identidade e interseccionalidade

Close-up de quatro mulheres diversas e de ascendência negra, posando juntas contra um fundo cinza. Elas olham para a câmera com expressões sérias e confiantes. Da esquerda para a direita: a primeira mulher tem longas tranças coloridas; a segunda, no centro, tem um cabelo afro volumoso; a terceira, ligeiramente atrás, tem cabelos escuros e lisos; e a quarta mulher, à direita, tem um cabelo crespo e vitiligo no rosto.

A FUNAFRO é um exemplo de mídia negra no Brasil. A mídia negra também tem papel central na construção ativa de representações positivas sobre a negritude. Em contraponto aos estereótipos impostos pela mídia hegemônica, ela oferece novas imagens, discursos e estéticas.

Stuart Hall, bell hooks e Carla Akotirene contribuem para pensar como a representação é um processo de disputa simbólica, e como o olhar interseccional permite identificar opressões cruzadas de raça, gênero e classe. A mídia negra, nesse sentido, é também um campo de luta semântica e política.

A metodologia da “roleta interseccional” (Carrera) nos permite compreender como as diferentes camadas de opressão moldam as experiências de sujeitos negros, revelando a potência da mídia negra em representar essa complexidade.

Mídia negra e os desafios do ambiente digital

Uma mulher negra com cabelo afro curto, vestindo um blazer de cor clara, está em um ambiente de alta tecnologia. Ela interage com uma grande tela de vidro transparente que exibe dados, gráficos e linhas de código em tons de azul brilhante. Sua expressão é focada e ela usa as mãos para manipular as informações na interface digital.

Com a digitalização da comunicação, novos desafios surgem. O primeiro é a barreira algorítmica: o racismo também está embutido nos códigos que determinam o que ganha visibilidade online. Tarcísio Silva chama esse fenômeno de “racismo algorítmico”, em que conteúdos negros são menos propagados, menos ranqueados e menos monetizados.

Outro desafio é a dependência de plataformas fechadas como redes sociais, que não oferecem total controle sobre distribuição e alcance. A saída tem sido investir em plataformas próprias com sistemas CMS (como o WordPress), construindo autonomia digital.

Muniz Sodré descreve essa realidade como parte da “sociedade incivil”, onde os vínculos sociais são enfraquecidos pela deslegitimação de vozes dissidentes.

Estratégias de visibilidade: jogando com os algoritmos

Uma mulher negra com cabelo afro curto, vestindo um terno vinho, sorri com confiança enquanto faz uma apresentação em um escritório. Ela segura um tablet e aponta para um quadro branco que exibe um diagrama de funil de vendas, gráficos de barras e termos de marketing digital, como "SEO" e "Palavras-chave", com os logotipos do Semrush e Google Analytics na parte superior. Em primeiro plano, uma plateia atenta a observa.

Diante desse cenário, torna-se essencial “jogar o jogo” da visibilidade. Isso significa aplicar estratégias como SEO (Search Engine Optimization), dataficação de interações, e comodificação de dados para sustentabilidade econômica, como defendem Van Dijck, Poell e de Waal.

O uso de ferramentas como Semrush, Ahrefs, Google Analytics e Ubersuggest pode ajudar a entender como o conteúdo está performando. Mais além, é preciso cuidar da experiência do usuário (UX), garantindo acessibilidade, responsividade e navegabilidade.

Ademais, a visibilidade é um ato político, como afirma John B. Thompson. Não basta existir digitalmente, é preciso ser percebido, compartilhado e legitimado.

O futuro: AEO, inteligência artificial e cibernética

Uma mulher negra com longas tranças, vestindo um traje moderno e escuro, está em um ambiente futurista. Ela interage com uma grande tela holográfica transparente, que flutua à sua frente exibindo gráficos e dados complexos em azul brilhante. Ao fundo, veem-se braços robóticos e uma paisagem urbana através de uma grande janela, sugerindo um cenário de alta tecnologia e inovação.

O próximo passo da mídia negra é explorar o AEO (Answer Engine Optimization), que otimiza conteúdos para assistentes de voz e IA. Isso amplia o alcance do conteúdo negro em novos formatos de busca.

A inserção no ecossistema digital exige adaptação constante. Investir em web semântica, metadados, marcação estruturada e integração com novas tecnologias será essencial para disputar narrativas e territórios digitais.

Letícia Cesarino, ao falar sobre cibernética, reforça a importância de compreender os sistemas tecnológicos como redes de poder simbólico. Nesse campo de forças, a mídia negra pode gerar “ressonâncias compartilhadas”, criando sentidos que se opõem à lógica dominante.

Por que consumir e apoiar a mídia negra?

Consumir mídia negra é um ato político. É fortalecer iniciativas que nos representam, que contam nossas histórias e que lutam contra o silenciamento. É apoiar a produção de conhecimento a partir de corpos e vivências negras, que historicamente foram excluídos dos espaços de fala.

Plataformas como Alma Preta, Afirmativa e Negro Nicolau precisam do nosso acesso, compartilhamento e engajamento para continuarem existindo e crescendo. Quando você compartilha um link, comenta uma matéria ou indica um conteúdo, você amplia a visibilidade de todo um ecossistema de resistência.

Se você chegou até aqui, já deu um passo importante. Que tal agora apoiar ativamente a mídia negra? Compartilhe este texto, siga perfis de jornalistas negros, consuma conteúdo feito por pessoas negras e incentive a sua rede a fazer o mesmo. A comunicação negra precisa de visibilidade, e você faz parte dessa construção.

Um grupo intergeracional de pessoas negras está reunido em um ambiente acolhedor, como um café. Em primeiro plano, uma jovem sorridente de blusa amarela segura um tablet e aponta para a tela, que exibe um cartaz digital com o título "MÍDIA NEGRA HOJE". Ao lado dela, um jovem e uma senhora de cabelos grisalhos olham para o tablet com interesse e alegria. Ao fundo, outras pessoas negras conversam e leem jornais, criando uma atmosfera de comunidade e engajamento.

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